Alta Idade Média e Românico de Cinzia Caiazzo. Público Comunicação Social. Porto, 2006, 430 págs. Mole
O próprio nome que damos a esta época tral um estereótipo. A Idade Média, ou “do Meio” – que fica “entre”, entendida como um longo interregno de trevas à espera do Renascimento. Na história arte deste periodo foram muitas vezes encontradas elementos ditos de degenerescência: a perspectiva, a proporção e a razão haviam sido perdidas. Em seu lugar, gárgulas e bizarrias proliferavam.
Para nós, herdeiros desse mesmo Renascimento e contemporáneos da fotografia, a arte deste período parece, frequentemente, estranha, simplista e esquemática. Olhamos para os mosaicos paleocristãos de Santa Maria Maggiore e parecem-nos irreais as cores e a colocação dos corpos: sem nexo as figuras desproporcionadas nos pórticos de São Lázaro; sem relevo o Cristo de Hagia Sophia, aparentemente suspenso num espaço dourado sem profundidade. Nota-se a repetição de motivos da arte bizantina ou das iluminuras, e tomamo-la como um defeito, ou incapacidade.
A incapacidade será a nossa, nascida de um erro de leitura. Procuramos a verosimihança, a representação credivel do mundo deste mundo. Procuramos na obra de arte a marca do génio seu criador. Na Idade Média, não é para este mundo que se vive, mas para o “outro” mundo que os Evangelhos anunciam. Pinturas, mosaicos, iluminuras e esculturas não são obra de artistas, mas trabalho de artesãos ao serviço de Deus. Não se trata de representar este mundo, mas de exaltar o próximo, de ensinar o caminho e os ritos, de ilustrar e glorificar o sagrado. Nesta tarefa, o que considerámos falhas eram instrumentos: os fundos dourados representavam o sagrado intemporal, exaltavam as Virgens que deles surgiam; os tamanhos relativos das figuras indicavam a sua importância; os grupos constituiam-se por razões narrativas; enquanto isso a aparência esquemática facilitava a interpretação; as cores simbolizavam atributos; e a repetição era enfática e utilitária.
Defendendo as pinturas nas igrejas, o teólogo Pedro Comestor dizia que eram quasi libri laicorum: livros para os que não sabem ler. Mais precisamente, os quadros estavam em lugar de um livro, o Livro, em torno do qual todas as facetas da vida nesta época largamente iletrada se organizavam.
A história da arte, como aliás de tudo o resto, é neste período, em grande parte, a história deste livro-a Biblia -:a história da sua difusão, interpretação e poder. O presente volume traça essa história, desde o édito de Constantino em 313, que dá liberdade de culto aos Cristãos, até à Virgem de Coppo de Marcovaldo, passando pelas grandes catedrais românicas francesas e ibéricas. E fornece-nos as chaves da sua leitura
10,00 €
O próprio nome que damos a esta época tral um estereótipo. A Idade Média, ou “do Meio” – que fica “entre”, entendida como um longo interregno de trevas à espera do Renascimento. Na história arte deste periodo foram muitas vezes encontradas elementos ditos de degenerescência: a perspectiva, a proporção e a razão haviam sido perdidas. Em seu lugar, gárgulas e bizarrias proliferavam.
Para nós, herdeiros desse mesmo Renascimento e contemporáneos da fotografia, a arte deste período parece, frequentemente, estranha, simplista e esquemática. Olhamos para os mosaicos paleocristãos de Santa Maria Maggiore e parecem-nos irreais as cores e a colocação dos corpos: sem nexo as figuras desproporcionadas nos pórticos de São Lázaro; sem relevo o Cristo de Hagia Sophia, aparentemente suspenso num espaço dourado sem profundidade. Nota-se a repetição de motivos da arte bizantina ou das iluminuras, e tomamo-la como um defeito, ou incapacidade.
A incapacidade será a nossa, nascida de um erro de leitura. Procuramos a verosimihança, a representação credivel do mundo deste mundo. Procuramos na obra de arte a marca do génio seu criador. Na Idade Média, não é para este mundo que se vive, mas para o “outro” mundo que os Evangelhos anunciam. Pinturas, mosaicos, iluminuras e esculturas não são obra de artistas, mas trabalho de artesãos ao serviço de Deus. Não se trata de representar este mundo, mas de exaltar o próximo, de ensinar o caminho e os ritos, de ilustrar e glorificar o sagrado. Nesta tarefa, o que considerámos falhas eram instrumentos: os fundos dourados representavam o sagrado intemporal, exaltavam as Virgens que deles surgiam; os tamanhos relativos das figuras indicavam a sua importância; os grupos constituiam-se por razões narrativas; enquanto isso a aparência esquemática facilitava a interpretação; as cores simbolizavam atributos; e a repetição era enfática e utilitária.
Defendendo as pinturas nas igrejas, o teólogo Pedro Comestor dizia que eram quasi libri laicorum: livros para os que não sabem ler. Mais precisamente, os quadros estavam em lugar de um livro, o Livro, em torno do qual todas as facetas da vida nesta época largamente iletrada se organizavam.
A história da arte, como aliás de tudo o resto, é neste período, em grande parte, a história deste livro-a Biblia -:a história da sua difusão, interpretação e poder. O presente volume traça essa história, desde o édito de Constantino em 313, que dá liberdade de culto aos Cristãos, até à Virgem de Coppo de Marcovaldo, passando pelas grandes catedrais românicas francesas e ibéricas. E fornece-nos as chaves da sua leitura
Alta Idade Média e Românico de Cinzia Caiazzo. Público Comunicação Social. Porto, 2006, 430 págs. Mole
O próprio nome que damos a esta época tral um estereótipo. A Idade Média, ou “do Meio” – que fica “entre”, entendida como um longo interregno de trevas à espera do Renascimento. Na história arte deste periodo foram muitas vezes encontradas elementos ditos de degenerescência: a perspectiva, a proporção e a razão haviam sido perdidas. Em seu lugar, gárgulas e bizarrias proliferavam.
Para nós, herdeiros desse mesmo Renascimento e contemporáneos da fotografia, a arte deste período parece, frequentemente, estranha, simplista e esquemática. Olhamos para os mosaicos paleocristãos de Santa Maria Maggiore e parecem-nos irreais as cores e a colocação dos corpos: sem nexo as figuras desproporcionadas nos pórticos de São Lázaro; sem relevo o Cristo de Hagia Sophia, aparentemente suspenso num espaço dourado sem profundidade. Nota-se a repetição de motivos da arte bizantina ou das iluminuras, e tomamo-la como um defeito, ou incapacidade.
A incapacidade será a nossa, nascida de um erro de leitura. Procuramos a verosimihança, a representação credivel do mundo deste mundo. Procuramos na obra de arte a marca do génio seu criador. Na Idade Média, não é para este mundo que se vive, mas para o “outro” mundo que os Evangelhos anunciam. Pinturas, mosaicos, iluminuras e esculturas não são obra de artistas, mas trabalho de artesãos ao serviço de Deus. Não se trata de representar este mundo, mas de exaltar o próximo, de ensinar o caminho e os ritos, de ilustrar e glorificar o sagrado. Nesta tarefa, o que considerámos falhas eram instrumentos: os fundos dourados representavam o sagrado intemporal, exaltavam as Virgens que deles surgiam; os tamanhos relativos das figuras indicavam a sua importância; os grupos constituiam-se por razões narrativas; enquanto isso a aparência esquemática facilitava a interpretação; as cores simbolizavam atributos; e a repetição era enfática e utilitária.
Defendendo as pinturas nas igrejas, o teólogo Pedro Comestor dizia que eram quasi libri laicorum: livros para os que não sabem ler. Mais precisamente, os quadros estavam em lugar de um livro, o Livro, em torno do qual todas as facetas da vida nesta época largamente iletrada se organizavam.
A história da arte, como aliás de tudo o resto, é neste período, em grande parte, a história deste livro-a Biblia -:a história da sua difusão, interpretação e poder. O presente volume traça essa história, desde o édito de Constantino em 313, que dá liberdade de culto aos Cristãos, até à Virgem de Coppo de Marcovaldo, passando pelas grandes catedrais românicas francesas e ibéricas. E fornece-nos as chaves da sua leitura
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